Lamentações
(Lm)
Escritor: Jeremias.
Lugar da Escrita: Perto de Jerusalém.
Data: 586-585 a.C.
Este livro das Escrituras inspiradas certamente é bem denominado. É uma
lamentação que expressa profundo pesar sobre aquele evento calamitoso na
história do povo escolhido de Deus, a destruição de Jerusalém, em 586
a.C., por Nabucodonosor, rei de Babilônia. Em hebraico este livro é
chamado segundo a sua primeira palavra, ´Eh·kháh!, que significa
“Como!”. Os tradutores da Septuaginta grega chamaram o livro de Thré·noi,
que quer dizer “Endechas; Lamentos”. O Talmude babilônico usa o termo Qi·nóhth,
que significa “Endechas; Elegias”. Foi Jerônimo, escrevendo em latim,
que lhe deu o nome de Lamentationes, de onde vem o título em português.
Nas versões em português da Bíblia, Lamentações é colocado depois de
Jeremias, mas no cânon hebraico acha-se geralmente nos Hagiógrafos, ou
Escritos, juntamente com O Cântico de Salomão, Rute, Eclesiastes e Ester
- pequeno grupo conhecido coletivamente por cinco Meghil·lóhth (Rolos).
Em algumas Bíblias hebraicas modernas acha-se colocado entre Rute ou
Ester e Eclesiastes, mas nas cópias antigas diz-se que vinha depois de
Jeremias, como no caso da nossa Bíblia hoje.
O livro não dá o nome do escritor. No entanto, há pouca dúvida de que
foi Jeremias. Na Septuaginta grega, o livro tem o seguinte prefácio: “E
aconteceu que, depois de Israel ter sido levado cativo e Jerusalém ter
sido desolada, Jeremias sentou-se chorando e lamentando com este lamento
sobre Jerusalém, e disse.” Jerônimo considerou espúrias estas palavras e
omitiu-as de sua versão. No entanto, atribuir Lamentações a Jeremias é a
tradição aceita dos judeus e é confirmada pela versão siríaca, pela
Vulgata latina, pelo Targum de Jonatã e pelo Talmude babilônico, entre
outros.
Alguns críticos tentaram provar que Jeremias não escreveu Lamentações.
Contudo, A Commentary on the Holy Bible (Comentário Sobre a Bíblia
Sagrada) cita, como evidência de que Jeremias foi o escritor, as
“vívidas descrições de Jerusalém, nos caps. 2 e 4, que são evidentemente
as descrições da pena de uma testemunha ocular; da mesma forma, o teor
de profunda condolência e de espírito profético do princípio ao fim dos
poemas, bem como o estilo, a fraseologia e o pensamento deles, são todos
muito característicos de Jeremias”. Há muitas expressões paralelas em
Lamentações e em Jeremias, tais como as de extremo pesar de ‘olhos dos
quais descem águas (lágrimas)’ (Lm. 1:16; 2:11; 3:48, 49; Jr. 9:1;
13:17; 14:17) e de desagrado para com os profetas e sacerdotes por causa
de sua corrupção. (Lm. 2:14; 4:13, 14; Jr. 2:34; 5:30, 31; 14:13, 14) As
passagens em Jeremias 8:18-22 e 14:17, 18 mostram que Jeremias era de
fato qualificado para escrever no estilo pesaroso de Lamentações.
Concorda-se, em geral, que o tempo da escrita foi logo depois da queda
de Jerusalém, em 586 a.C.. O horror do sítio e do incêndio da cidade
ainda estavam bem vivos na mente de Jeremias, e a sua angústia é
vividamente expressa. Certo comentarista observa que nenhuma faceta
única de pesar é plenamente explorada em qualquer dado lugar, mas cada
uma retorna, vez após vez, nos diversos poemas. Daí, ele diz: “Este
tumulto de pensamento . . . é uma das mais fortes evidências de que o
livro está perto dos eventos e das emoções que tenciona comunicar.”
A estrutura de Lamentações é de grande interesse para quem estuda a
Bíblia. Há cinco capítulos, ou seja, cinco poemas líricos. Os quatro
primeiros são acrósticos, cada versículo começando sucessivamente com
uma das 22 letras do alfabeto hebraico. Por outro lado, o terceiro
capítulo tem 66 versículos, de modo que 3 versículos sucessivos começam
com a mesma letra antes de passar para a próxima letra. O quinto poema
não é acróstico, embora tenha 22 versículos.
Lamentações expressa extremo pesar por causa do sítio, da captura e da
destruição de Jerusalém, efetuados por Nabucodonosor, e é imbatível em
qualquer literatura na sua natureza vívida e patética. O escritor
expressa profunda tristeza por causa da desolação, miséria e confusão
que vê. A fome, a espada e outros horrores trouxeram à cidade um
sofrimento pavoroso - tudo uma penalidade direta da parte de Deus, por
causa dos pecados do povo, dos profetas e dos sacerdotes. No entanto, a
esperança e a fé em Deus permanecem, e a ele são dirigidas as orações
pela restauração.
CONTEÚDO DE LAMENTAÇÕES
“Como ela veio a ficar sentada sozinha, a cidade que abundava em povo!”
Assim começa o seu lamento.
O primeiro poema. A filha de Sião era uma princesa, mas, seus
amantes a abandonaram e seu povo foi ao exílio. Seus portões estão
desolados. Deus a puniu por causa da abundância de suas transgressões.
Ela perdeu seu esplendor. Seus adversários riram-se de sua queda.
Sucumbiu de modo espantoso e não tem consolador, e o povo que sobrou
está faminto. Ela (a Jerusalém personificada) pergunta: “Existe alguma
dor igual à minha dor?” Estende as mãos e diz: “Deus é justo, pois foi
contra a sua boca que me rebelei.” (1:1,12,18).
Clama a Deus para que traga calamidade sobre seus inimigos exultantes,
assim como trouxe sobre ela.
“Como Deus, na sua ira, enublou a filha de Sião!” (2:1)
O segundo poema mostra que é o próprio Deus quem derrubou por
terra a beleza de Israel. Fez que se esquecesse da festividade e do
sábado, e deitou fora Seu altar e santuário. Oh! as cenas patéticas em
Jerusalém! Jeremias exclama: “Meus olhos acabaram em puras lágrimas.
Meus intestinos estão em fermento. Meu fígado se derramou por terra por
causa da derrocada da filha do meu povo.” (2:11) A que assemelhará ele a
filha de Jerusalém? Como consolará a filha de Sião? Seus próprios
profetas mostraram ser imprestáveis e incompetentes. Agora os que passam
por ali riem zombeteiramente dela: “É esta a cidade da qual se dizia:
‘Ela é a perfeição da lindeza, uma exultação para toda a terra’?” (2:15)
Os seus inimigos abriram a boca e assobiaram, e rangeram os dentes,
dizendo: ‘Este é o dia que esperávamos para tragá-la.’ Seus filhos se
debilitam devido à fome e mulheres comem seus próprios filhos. Cadáveres
estão espalhados pelas ruas. “No dia da ira do Senhor não se mostrou
haver nem fugitivo nem sobrevivente.” (2:16, 22).
O terceiro poema, de 66 versículos, frisa a esperança de Sião na
misericórdia de Deus. Mediante muitas metáforas, o profeta mostra que
foi Deus quem trouxe o cativeiro e a desolação. Na amargura da situação,
o escritor pede a Deus que se lembre de sua aflição, e expressa fé na
benevolência e nas misericórdias de Deus. Três versículos sucessivos
usam no início a palavra “bom”, e mostram que é apropriado esperar a
salvação da parte do Senhor. (3:25-27) Deus causou o pesar, mas mostrará
também misericórdia. Mas por ora, não obstante a confissão de rebeldia,
Deus não perdoou; bloqueou as orações do seu povo, fazendo deste um
“mero rebotalho e refugo”. (3:45) Com lágrimas amargas, o profeta
relembra que seus inimigos estavam à caça dele como atrás de um pássaro.
Entretanto, Deus aproximou-se dele no poço e lhe disse: “Não tenhas
medo.” O profeta invoca a Deus para que responda ao vitupério do
inimigo: “Perseguirás em ira e os aniquilarás de debaixo dos céus do
Senhor Deus.” (3:57, 66).
“Como fica fosco o ouro reluzente, o ouro bom!” (4:1)
O quarto poema lamenta a glória desvanecida do templo de Deus,
cujas pedras são derramadas nas ruas. Os filhos preciosos de Sião
tornaram-se de pouco valor, semelhantes a talhas de barro. Não há nem
água nem pão, e os que foram criados no luxo “tiveram de abraçar montes
de cinzas”. (4:5). A punição é até maior do que pelo pecado de Sodoma.
Os nazireus, outrora ‘mais puros do que a neve e mais brancos do que o
leite’, tornaram-se ‘mais escuros do que o próprio negrume’ e estão todo
enrugados. (4:7, 8). Melhor seria ter sido morto pela espada do que pela
fome, numa época em que as mulheres cozinharam seus próprios filhos!
Deus derramou a sua ira ardente. Sucedeu o inacreditável
-- o adversário entrou pelos portões de Jerusalém! E por quê? “Por causa
dos pecados dos seus profetas, pelos erros de seus sacerdotes”, que
derramavam sangue justo. (4:13). A face do Senhor não está voltada para
eles. Não obstante, o erro da filha de Sião chegou ao seu fim, e não
mais será levada ao exílio. Agora, ó filha de Edom, é a sua vez de beber
o copo amargo de Deus!
O quinto poema se inicia com uma solicitação para que Deus se
lembre de seu povo que se tornou órfão. Representam-se os habitantes de
Jerusalém como que falando. Seus antepassados é que pecaram, e é o erro
deles que precisam agora levar. Meros servos dominam sobre eles, e são
torturados pela agonia da fome. A exultação de seu coração cessou e a
sua dança se transformou em luto. Seu coração está enfermo. Reconhecem
humildemente a Deus: “Quanto a ti, ó Deus, estarás sentado por tempo
indefinido. Teu trono é por geração após geração.” Clamam: “Traze-nos de
volta, ó Deus, a ti mesmo, e nós prontamente voltaremos. Traze-nos novos
dias como outrora. Todavia, rejeitaste-nos positivamente. Indignaste-te
muito conosco.” (5:19-22).
POR QUE É PROVEITOSO
O livro de Lamentações expressa a completa confiança de Jeremias em
Deus. Na mais extrema angústia e esmagadora derrota, sem haver
absolutamente esperança de conforto de alguma fonte humana, o profeta
aguarda a salvação da mão do grande Senhor do universo. Lamentações deve
inspirar em todos os verdadeiros adoradores a obediência e integridade,
dando ao mesmo tempo aviso temível concernente àqueles que desconsideram
o maior dos nomes e o que este representa. Não há registro na história
de outra cidade arruinada que tenha sido lamentada em tal linguagem
patética e comovente. É, certamente, proveitoso em descrever a
severidade de Deus para com os que continuam a ser rebeldes, obstinados
e impenitentes.
Lamentações é também de proveito em mostrar o cumprimento de bom número
de advertências e profecias divinas. (Lam. 1:2 Jer. 30:14; Lam.2:15 Jer.
18:16; Lam. 2:17 Lev. 26:17; Lam. 2:20 Deut. 28:53) Note, também, que
Lamentações fornece um testemunho vívido do cumprimento de Deuteronômio
28:63-65. Outrossim, o livro contém numerosas referências a outras
partes das santas Escrituras. (Lam. 2:15 Sal. 48:2; Lam. 3:24 Sal.
119:57) Daniel 9:5-14 confirma Lamentações 1:5 e 3:42 em mostrar que a
calamidade veio devido às próprias transgressões do povo.
É realmente confrangedor o trágico flagelo de Jerusalém! No meio de tudo
isso, porém, Lamentações expressa confiança de que Deus mostrará
benevolência e misericórdia e de que se lembrará de Sião e a trará de
volta. (Lam. 3:31, 32; 4:22) Expressa esperança em “novos dias”, como no
tempo antigo, quando os reis Davi e Salomão reinavam em Jerusalém. Ainda
vigora o pacto de Deus com Davi para um reino eterno! “As suas
misericórdias certamente não acabarão. São novas cada manhã.” E
continuarão para com os que amam a Deus até que, sob o seu justo domínio
do Reino, toda criatura que vive exclame em agradecimentos: “Deus é o
meu quinhão.” (5:21; 3:22-24).